segunda-feira, 29 de outubro de 2012

peso morto


Sonhei que tinha perdido minha mala. Todas minhas coisas mais preciosas nas mãos de outras pessoas. Procurei, procurei, me prendia ao desejo de revê-la. Entrei em desespero ao imaginar que pudessem fuçar nas minhas roupas, perfumes e brincos. Tudo aquilo que representava alguma coisa: memórias, lembranças, sensações.

Mais tarde, percebi que não adiantava ter minha mala de volta, ela já havia sido corrompida pelos olhares alheios. Tiraram-me a mala e levaram metade minha embora. Eles corriam para alcançar o trem enquanto se livravam do peso morto. Eu também precisaria me libertar. Os sinais diziam que a leveza seria alcançada através da perda.

Como quem sabe exatamente as respostas, fiz o que precisava ser feito. Nem sempre as ações me faziam melhor, mas eram necessárias. 

daquilo que se foi


num par certo, eu não teria que te pedir para me surpreender, para me conquistar e me fazer sentir querida. eu não teria que te alertar sobre minha insegurança e chorar rios a cada discussão por saber que tudo o que peço não será atendido. eu não poderia duvidar de nós a cada segundo e te ter na cabeça constantemente só pelo medo de te perder. eu não poderia estar bem ao seu lado, mas em prantos longe de você. eu não poderia aceitar você não sendo tão carinhoso ou atencioso quanto eu gostaria que fosse. eu não poderia suportar sua falta de amor.

eu já não aguento mais ocupar essa posição, ser o lado mais fraco, quando foi você quem errou, não errou. eu não aguento mais achar que a culpada por estarmos juntos sou eu, que por minha insistência assim estamos. não aguento perceber que estou sozinha nesse barco, que você entra e sai quando quer enquanto eu remo sozinha por um oceano de lágrimas. eu não quero cautela, eu não quero esperar, eu não quero. não consigo me ver infeliz sabendo que tudo é minha culpa e que não tomo resoluções por medo.

odeio ter medo. odeio a perspectiva de ficar sozinha e me odeio ainda mais por pensar que talvez não conseguiria. chego a me odiar por sua culpa. por estar nesse papel, me submetendo a tudo isso, quando não devia.

quando simplesmente seria melhor desistir, deixar ir. só me falta mais força, talvez mais mágoa. me falta perceber que sem você seria horrível, mas nada é diferente do modo como está. 

cena 01

Hoje o dia pareceu claro. Enquanto caminhava a luz cegava meus olhos e nesses momentos me remetia a lembranças daquele tempo, do seu vestido arrastando pelo chão enquanto você se escondia pelas ruas. Levava seu cheiro e minha visão a todos os lugares. Eu te acompanhava de longe, hipnotizado pelo vermelho de seu vestido. As flores no cabelo enfeitavam a cena e eu pintava o quadro em minha cabeça, com todas as cores que te pertenciam. O calor me deixava lento, era eu quem me arrastava. Seu vestido se tornava negro conforme varria as ruas daquela cidade e junto dele eu me enegrecia coberto do manto de perversão que me envolvia, mas ainda te fazendo não me perceber. Eu me escondia.

inexistência

Tudo que sei é da distância, aquela que odeio e me faço suportar. Tentando não me perder, voltando a pensar em tudo que tivemos, me assusto com o futuro e com a interrogação de tudo que planejei. Como se a vida fosse me levar àquele momento exato. Me entendo com as mudanças, com a rota não traçada e te faço pensar. Enquanto os violinos tocam, eu perco o chão. Cruzo o espaço e num instante me vejo sozinha. Você não está lá, você nunca esteve.

do lado de lá

Eu te pedi a verdade
Exigi que a realidade fosse encarada
Perguntei se tinha algo a me falar
Algo que eu deveria escutar.

E você se manteve em silêncio
Frente a mim, aos seus atos, o que anseio
Agora eu me pergunto, para onde isso te levou?
Pois cá estamos nós, magoados pela conversa que não tivemos.